quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

CRÓNICA DE SEVILHA.


A manhã estava fresca e os receios da vinda de chuva não se confirmaram, chegámos  1,30h antes da prova ter início para calmamente preparar tudo até há hora do início pelas 9,30h.
Notava-se algum nervosismo no ar, troquei mais algumas palavras com o Joaquim Gomes sobre a prova e sobre o que iríamos encontrar quando entrássemos para os túneis do Estádio Olímpico de Sevilha. Estavam inscritos perto de 5 mil atletas e sabia da confusão que aquilo podia gerar se as coisas corressem para o torto. Mas não, logo que os portões abriram ordeiramente todos se dirigiram para os locais pré-destinados para os preparativos finais, casas de banho móveis, locais de aquecimento térmico, grande espaço para recolha de sacos de muda de roupa, espaço suficiente para aquecimento, quer nos túneis quer na pista de atletismo, tudo feito ordeiramente e sem confusões debaixo de um sistema discreto de vigilância e controlo da organização que quase ninguém deu por isso.
O Joaquim Gomes andou sempre de olho em mim, mostrando sempre grande tranquilidade mas com o cuidado de nunca me perder de vista, ambos utilizámos as casas de banho para aliviar um pouco e preparámo-nos para o passo final, o acesso à pista onde seria dado o tiro de partida, faltariam na altura cerca de 20 minutos.
O Céu continuava encoberto mas não se sentia a mínima brisa embora o frio ainda fosse intenso mas facilmente suportável, foi assim que iniciámos o curto aquecimento antes do início da prova, de imediato o Spiker da prova descobriu o J.Gomes e entabulou logo ali uma pequena entrevista, descontraído não se fez de rogado e todos gostaram de saber que era a sua estreia e a sua meta eram as 4 horas. Eu gostei de ouvir e no meu íntimo verifiquei que ele estava descontraído e podia fazer uma excelente prova.
Partimos juntos no meio daquela massa imensa que levou cerca de 7 minutos a sair da pista, cruzar os túneis e até se fazerem estrada fora, o público era imenso e o apoio começava ali mesmo à saída do Estádio. Nos primeiros kms ainda segui com o Joaquim Gomes mas a pouco e pouco prudentemente ele foi ficando para trás até eu o perder de vista, mesmo quando nos cruzámos pelos 4,5kms devido à grande massa humana que por ali se cruzava, não deu para o observar. Contudo eu ia confiante que ele se estava a proteger devido ao facto de nunca ter percorrido a distância da Maratona.
Um pormenor importante se notou logo quase desde o início, os abastecimentos líquidos estavam a cada 2,5kms e era importante que não ignorássemos a sua presença pois poderia sair-nos caro lá mais para a frente quando as coisas começassem a doer, tinha alertado também o J.Gomes para este pormenor e vinha tranquilo quanto a isso.
O apoio do público continuava constante, a nossa claque do Mundo da Corrida foi extraordinária, nos locais onde a sua presença se fazia notar ficávamos orgulhosos pelo intenso barulho que faziam, eram apitos, vuvuzelas, gritos bem sonoros, eu sei lá, da parte dos espanhóis é conhecida a sua simpatia e adesão ao desporto, particularmente a corrida, foram incansáveis também durante todo o percurso, eu ia equipado com um camisola que identificava o nosso País e por este facto Portugal foi sendo sempre incentivado, até nem se esqueciam do campeão Ronaldo ao associarem o nome de Portugal. Um pouco mais atrás seguia o Joaquim Gomes que mesmo no meio daquela multidão de atletas seguia isolado e compenetrado apenas na sua corrida, levava vestido a camisola do nosso grande Clube e outra não quis vestir, era a estreia e tinha um simbolismo muito grande.
O controlo da corrida era feito a cada 5 kms com registo do chip, era também um bom contributo para que os atletas pudessem dessa forma controlar melhor a sua corrida, foi assim que cruzei a passagem da Meia Maratona com 2 horas exactas, embora já denotando algum cansaço nas pernas. O Joaquim Gomes chegaria ali 3 minutos depois, 2,03h. e seguia em excelentes condições.
A partir dali comecei interiormente a traçar objectivos, chegar aos 5 kms seguintes e hidratar, a organização, a espaços, para além de água e isotónicos  ia dando também pedaços de laranja que serviam para aconchegar um pouco o estômago (isto para quem nada levava de reserva), eu tinha levado 3 pacotes de Gel e alguns quadrados de marmelada para tentar ir repondo alguma energia que ia perdendo conforme ia evoluindo para a fase mais crítica da prova. Sabia que o Joaquim Gomes também se tinha acautelado e vinha preparado para fazer frente a essas necessidades.
Aos 26 kms sou alcançado pelo J.Gomes, diz-me que sente muito bem e que agora vai tentar fazer o melhor possível, aconselho-o a ter muito cuidado porque a parte mais difícil da prova ainda estava para chegar. Confesso que fiquei muito contente por o ver ali e cheio de esperança que iria conseguir uma grande prova, não demorou muito para eu o perder de vista, só voltaria a encontrá-lo já depois de eu cortar a linha de meta.
Prossegui-a agora mais lentamente tentando chegar aos 30 kms, apesar de tudo já ia ultrapassando muita gente que ainda estava pior que eu, a cada etapa de 5 kms aproveitava para andar um pouco (100m no máximo) bebia água e comia alguma coisa. Foi assim até entrar no Estádio Olímpico, uma sensação de grande alívio e satisfação, valera a pena sofrer para lá chegar, é mágico aquilo que sentimos e eu era a 10ª vez que me emocionava, sim porque não é vergonha confessá-lo, ali mesmo pousei a cabeça numa das grades de protecção e dei largas à emoção que me invadiu por breves momentos. Sigo para a zona mista, dão-me  um toalhão onde sou embrulhado e dou de caras com o Joaquim Gomes, que felicidade ele tinha estampado no rosto, avançou rápido para mim e abraçou-me, também ele emocionado não conseguiu esconder o que lhe ia na alma. Fiquei feliz por ter apadrinhado ali mesmo o aparecimento de mais um maratonista no nosso grande grupo de amigos, e como ele estava feliz, tinha finalizado com 4,01h e ainda me disse que nos últimos metros ainda tinha tentado as 4 horas certas. A sua 2ª metade da prova tinha sido mais rápida do que a 1º, sinal de que estava bem treinado e enfrentou a prova com respeito e com grande responsabilidade. Assim tenho a certeza que vamos continuar a ter Maratonista para o futuro, e ele escolheu bem a prova para o fazer pela 1º vez.
Ao contrário eu não consegui fazer a 2ª parte igual à 1ª, perdi 13,5m em resultado de fortes dores nos rins e falta de força nas pernas, nada que eu já não esperasse mesmo antes de iniciar a prova. Concluí com 4,13,25h no meu registo do Garmin.
Esta excelente Maratona em Sevilha tem tudo para continuar a merecer a nossa deslocação, gostaria de ver aumentado o número de amigos a fazer a viagem e participar nesta mítica distância da Maratona para o próximo ano. Estão convidados.  

2 comentários:

Leonel Neves disse...

Com um relato destes conseguimos fazer a prova do princípio ao fim,sem treinar, experimentando as sensações que qualquer atleta experimenta, mesmo não estando lá. Parabens, portanto, ao Joaquim Adelino pela descrição pormenorizada e apaixonada, da corrida. Gostava de ver um dia estas descrições em livro.
E o Joaquim Gomes, com direito a entrevista e tudo ãh!Eu já fiz dez maratonas e ainda nunca fui entrevistado, não é para todos, pois não!? Parabéns amigo Gomes pela tua primeira maratona.
Um abraço aos dois e a todos os Amigos Vale Silêncio.

ESTÓRIAS DE PORTUGAL disse...

Meus caros, eu fiquei muito motivado com esta bela crónica. Para o ano também vou - só se tiver de voltar a Berlim. Onde já fiz um treino longo (2h20 à noite e ao frio). J Adelino, vemo-nos nos trilhos de sicó. Abraços Portugal